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Gedenkfeier für Wolf Bergmann im Palácio Foz in Lissabon

In Anlehnung an die Gedenkfeier für Wolf Bergmann, die von der PHG im Februar 2004 im Hirschparkhaus veranstaltet wurde (siehe Bericht im PP 26, S. 18), fand jetzt in Lissabon im Spiegelsaal des Palácio Foz (www.ics.pt/palaciofoz/frames.html) eine weitere Gedenkfeier statt. Dabei waren circa 50 Personen anwesend, davon eine Reihe persönlicher Freunde Bergmanns.




Programm



Zum 100. Geburtstag von
Wolf Bergmann (1904 - 1972)

"Immer all das Fliehen,
mit dir war es gut und klug."

Die deutsch-portugiesische Exilsgeschichte
von Charlotte und Wolf Bergmann

Nach einer Zusammenstellung von Christian Casdorff

Sprecher :
    Der Gedichte: Hélder Lourenço
    Der Prosa: Ursula Jerosch Herold
Klavier: Carina Lasch
Geige: Imke Hinrichs

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No Centésimo Aniversário de
Wolf Bergmann (1904 - 1972)

"Sempre em fuga,
contigo foi bom e certo."

A História Luso-Alemã do Exílio
de Charlotte e Wolf Bergmann

Adaptação dum arranjo de Christian Casdorff


Poemas recitados por Hélder Lourenço
Prosa lida por Ursula Jerosch Herold
Piano Carina Lasch
Violino Imke Hinrichs

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Wolf Bergmann
"Immer all das Fliehen … "
"Beco"
Zwei Gedichte aus "Atlantische Landschaft"
Dazu: "Volkslied"
Reinhold Glier (1875-1956)


Charlotte Bergmann
Chronik der Emigration 1932 - 1954
Dazu: "Romanze"
Antonin Dvorak (1841-1904)
"Largo" aus dem Konzert in a-moll
Antonio Vivaldi (16704-1742)
"Gavotte" aus der Sonate in d-moll
Jean BaptisteLoeillet de Gand (1688-?)


Sätze aus Briefen von Wolf Bergmann
Über seine Gedichte
Über ein konkretes Problem als Institutsleiter
Dazu:
"Variationen"
Ludwig van Beethoven (1770-1827)


Wolf Bergmann
Sieben Mondgedichte aus "Atlantische Landschaft"
Verbunden mit dem Abendlied
von Matthias Claudius (1740-1815)
Dazu: Kleine "Abendlied"-Musiken
Theophil Laitenberger (1903-1996)
Hermann Schroeder (1904-1984)
Otto Abel (1905-1977)
Kurt Fiebig (1908-1988)


Sätze von Reinhold Schneider (1903-1958) an Wolf Bergmann
Ein Brief des Ellermann-Verlages (Hamburg) an Charlotte Bergmann
Dazu: "Psalm 22"
Thomas Gabriel (1957- )

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Wolf Bergmann
"Sempre em fuga … "
"Bêco"
Dois poemas de "Paisagem Atlântica"
Com: "Volkslied"
Reinhold Glier (1875-1956)


Charlotte Bergmann
Crónica da Emigração 1932 - 1954
Com: "Romanze"
de Antonin Dvorak (1841-1904)
"Largo" do Concerto em fá menor
de Antonio Vivaldi (16704-1742)
"Gavotte" da Sonata in dó-menor
de Jean BaptisteLoeillet de Gand (1688-?)


Excertos de cartas de Wolf Bergmann
Sobre os seus poemas
Sobre um problema concreto como director dum instituto
Com:
"Variationen"
Ludwig van Beethoven (1770-1827)


Wolf Bergmann
Sete poemas lunares de "Paisagem Atlântica"
Em conjunto com "Canção do Anoitecer"
de Matthias Claudius (1740-1815)
Com: Pequenos trechos sobre a"Canção do Anoitecer"
Theophil Laitenberger (1903-1996)
Hermann Schroeder (1904-1984)
Otto Abel (1905-1977)
Kurt Fiebig (1908-1988)


Algumas frases de Reinhold Schneider (1903-1958) dirigidas a Wolf Bergmann
Uma carta da editora Ellermann (Hamburgo) a Charlotte Bergmann
Com: "Psalm 22"
Thomas Gabriel (1957- )




Begrüßung



Begrüssungsansprache von
Bernardo Jerosch Herold


Boa noite, guten Abend,

Em primeiro lugar quero cumprimentar e agradecer a presença daqueles que, apesar de não terem grandes conhecimentos de alemão não deixaram de querer estar aqui hoje, movidos pela amizade e admiração que tinham pelos Bergmanns, apesar de saberem que com excepção desta introdução todo o resto se passará em alemão. Quando me apercebi da intenção de virem cá hoje, tentei arranjar traduções portuguesas de tantos textos quanto possível. Aproveito a ocasião para agradecer à Clarisse Ferreira dos Santos, ao Johannes e Marta Laitenberger e à minha mulher Ursula a sua colaboração. Infelizmente não consegui arranjar atempadaments traduções dos sete "poemas lunares" do Wolf e das sete estrofes da canção do anoitecer de Matthias Claudius. Os restantes textos encontram-se nas vossas mãos com versões nas duas línguas. Este serão segue em grande parte um arranjo que Christian Casdorff fez para uma sessão que teve lugar há alguns meses em Hamburgo. Quanto aos trechos de música aproveitaram-se no entanto apenas as variações de vários compositores sobre a melodia que Johann Schulz compôs 1790 para o poema de Matthias Claudius de 1779. Os trechos de compositores portugueses que se deram a conhecer aos ouvintes hanseáticos substituiram-se por música de outros compositores. A escolha desses trechos foi feita com muito gosto e sensibilidade pelas próprias executantes Carina Lasch e Imke Hinrichs a quem agradeço muito toda a sua colaboração e entusiasmo. Resta agradecer ao Hélder Lourenço e à Ursula terem se prontificado a colaborar nas recitações e leituras.

Ich begruesse die Zuhoere die deutsch verstehen ebenfalls sehr herzlich. Sie werden die portugiesischen Uebersetzungen der Texte zwar nicht brauchen aber werden sich trotzdem sicher meinem Dank fuer die Mitarbeit als Uebersetzer der Clarisse Ferreira dos Santos, Johannes und Marta Laitenberger und meiner Frau anschliessen.
Die Zusammenstellung der Texte geht auf Christian Casdorff zurueck, der im Fruejahr in Hamburg auch eine Gedenkfeier zum 100. Geburtstag von Wolf Bergmann veranstaltet hat. Dort wurden die Hamburger Teilnehmer mit Arbeiten portugiesischer Komponisten bekannt gemacht. Hier werden andere Stuecke geboten die von den Ausfuehrenden selber, Carina Lasch und Imke Hinrichs mit viel Geschmack und Einfuehlungsvermoegen ausgewaehlt worden sind. Ihnen sei herzlich gedankt wie auch dem Rezitator der Gedichte Hélder Lourenço und der Vorleserin der Prosa, meiner Frau Ursula.

Agradeço também o apoio que as comunidades católica e evangélica alemãs, bem como o Goethe-Institut me deram na divulgação deste serão, bem como o apoio moral e material que me deram as pessoas amigas do casal Bergmann em cujo nome formulei este convite: Teresa Balté, João Bénard da Costa, Ben e Alrun Almeida Faria, Edith Foerster, Paulo de Freitas, Helga Hoock-Quadrado, Georg Laitenberger, Ingelore Oehmichen, Paul Rixner, Christa e Gerhard Schickert, Isabel Tamen e a minha família.

Nem todos podem estar hoje aqui por vários impedimentos de natureza profissional, um deles, o João Bénard da Costa enviou-me a seguinte mensagem que passo a ler:

"Ausente no estrangeiro e por isso impossibilitado, com grande pena minha, de estar presente nesta justíssima homenagem, quero dar testemunho do muito que devo ao Prof. Wolf Bergmann, que conheci em 1954, quando veio viver para Lisboa, e com quem tanto convivi nos anos 50 e 60, até à morte dele."

"Foi a pessoa mais clara e mais luminosa que já conheci e quem mais se aproximou da minha ideia de santo e da minha ideia de sábio. Foi, para mim e para tantos, um Mestre e um Amigo. Entre os esplendores da luz perpétua, sei que descansa em paz."

Ich danke auch fuer die Unterstuetzung bei der Bekanntmachung dieses Abends von Seiten der deutschsprachigen Kirchengemeinden beider Konfessionen, sowie des Goethe-Instituts. Last not least danke ich den Personen in deren Namen (die ich eben verlesen habe) ich diese Einladung ausgesprochen habe fuer moralische und materielle Unterstuetzung.

Aus verschiedenen Gruenden koennen heute nicht alle zugegen sein. Einer unter ihnen, naemlich João Bénard da Costa hat mich gebeten folgende Grussadresse zu verlesen.

"Da eine Auslandsreise es mir leider nicht ermoeglicht dieser verdienten Ehrung beizuwohnen, moechte ich dennoch bezeugen wie viel ich Wolf Bergmann verdanke den ich 1954 kennenlernte als er nach Lissabon zog und mit dem ich in den 50er und 60er Jahre so oft zusammen gewesen bin."

"Er war der klarste und leuchtendste Mensch den ich jemals kennengelernt habe und der meiner Idee eines Heiligen und eines Weisen am naechsten gekommen ist. Fuer mich und viele andere war er gleichermassen ein Meister und ein Freund. Ich bin mir gewiss, dass er im Glanze des ewigen Lichtes in Frieden ruht".

Geben wir jetzt Wolf und Charlotte Bergmann das Wort.

Dêmos agora a palavra a Wolf e Charlotte Bergmann.




Crónica da Emigração 1932 a 1954


Wolf e Charlotte Bergmann

Apontamentos de Charlotte Bergmann

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Wolf Paul Alexander Bergmann
(4.2.1904 - 7.10.1972)
Charlotte Bergmann n. Manasse
(3.10.1907 - 14.4.1998)


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Alemanha 1932 a 1934

No verão 1932 o Wolf disse à minha Mãe: "Frau Manassse, pegue em todas as suas poupanças e vá viver para a Suiça, e deixe-me casar com a Charlotte. Não tarda que nem uma coisa nem a outra seja possível." A explosão de fúria materna foi de boa cêpa.

Eu tinha acabado de passar com a nota de bom no exame de estado de Medicina em Würzburg 1, e imediatamente a seguir na minha prova de doutoramento (incluindo uma lição seguida de discussão na Aula Magna perante professores e estudantes) com a nota magna cum laude. Imediatamente a seguir comecei a trabalhar como Assistente Voluntária na clínica oftalmológica da Universidade de Würzburg 2.

O Wolf estava nessa altura a preparar a sua tese de doutoramento sobre o poeta Georg Heym, que foi recusada pelo Professor W. (este revelou-se depois um grande nazi, apesar do seu cabelo grisalho). O Wolf entregou então a mesma tese ao germanista Pofessor Schulz em Frankfurt que a aceitou imediatamente. A 1 de Abril de 1933 fui informada pelo director da clínica que devia abandonar imediatamente a mesma: Ordem de serviço do Ministério do Estado da Baviera de expulsão de todas as pessoas de famílias judaicas dos institutos do Estado.

Obviamente a nossa mãe achou que isso era coisa para vigorar só durante umas semanas - e que depois as coisas iam voltar à normalidade. Pois iam!!!

O meu irmão Otto foi o primeiro a perder a paciência, alias o optimismo, e foi para a Grã-Bretanha e conseguiu ser aprovado, passado pouco tempo, no exame de medicina britânico com a consequente autorização de praticar medicina em Londres.

Wolf, com a sua sensibilidade, não conseguia suportar este cenário de injustiça (bem patente a toda a gente) por mais tempo e (deixando a Alemanha com apenas uma malinha de mão e 10 Marcos, mais do que isso era proibido!), em Setembro, aceitou um convite do seu primo Anton Bergmann, um historiador de arte que vivia em Roma com mulher e três filhos, com o encargo agradável de gastar a fortuna da sua mãe holandesa. Wolf procurou desesperadamente encontrar trabalho, mas foi impossível: As instituições alemãs em Roma, não o aceitavam porque era emigrante, e as italianas não estavam interessadas. Assim teve de se limitar a ajudar o primo na escrita das suas publicações. Passado pouco tempo não suportava mais essa situação de dependência e foi ter à Alsácia com a sua irmã Edith Mathis, onde viveu durante algum tempo, primeiro como convidado e depois contra pagamento duma mensalidade.

A mim também me provocavam náuseas a incerteza e a inactividade, e, em Novembro, fui a Paris ter com uma amiga da Mãe dos seus tempos de escola 3 cujo cunhado, que como ex-colaborador de Clémenceau tinha as melhores relações com entidades oficiais. Este cunhado foi ter com um Secretário de Estado munido duma carta de recomendação de Albert Schweitzer parq conseguir uma autorização de residência para eu poder completar a minha especialização em Medicina. Foi me dito que teria uma resposta daí a quinze dias. Pois ainda hoje estou à espera dessa resposta.

Encontrei-me finalmente com o Wolf em Nancy, onde o nosso amigo Robert Minder era Professor de Germanística da Universidade. A seguir festejámos o Natal em casa da Edith. Um dia fomos a Basileia, e estávamos sentados num café - bastante desesperados - quando se sentou à nossa mesa um amigo da Edith, um violinista checo judeu. Falámos-lhe nas nossas preocupações, o que o levou a prometer-nos ajuda imediatamente: "O Professor de Oftalmologia , um báltico, é melómano, donde resulta conhecê-lo pessoalmente; além disso é um grande anti-nazi." Ele arranjou uma possibilidade de eu ser recebido por esse homem gentil, e que prometeu (e cumpriu) aceitar- me, depois da entrega dum curriculum vitæ, como Assistente Voluntária na sua clínica.

Voltei a Würzburg e esperei durante dois longos meses - e finalmente veio a autorização.

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Suiça 1934 - 1936

A Suiça dessa época não era de modo algum um paraíso para emigrantes: Basileia estava pejada de informadores nazis; até chegou a haver raptos de emigrantes. De três em três meses tinha de me apresentar na polícia de estrangeiros, pagar 14 Francos (uma pequena fortuna) e provar que tinha uma boa reputação e meios de subsistência suficientes.

Daí a pouco o Wolf teve de sair de casa da sua irmã - esta estava no meio dum processo de divórcio. Através dum amigo dela, conseguiu arranjar habitação num escritório de advogados devoluto há longos anos, embora muitas vezes não conseguisse levantar-se da cama, tanto reumático tinha. Para mim tinha encontrado um quarto de mansarda (cerca 2 por 3 metros) que era tão húmido que o papel de parede nunca ficava colado. Quando o Wolf se apresentou na polícia de estrangeiros de Basileia, o funcionário perguntou-le se era judeu. - "Não, não sou." - "Então é comunista". - "Não, também não sou." - "Então não pode permanecer na Suiça." - "Eu quero estudar na Universidade de Basileia." - "Isso pode. Mas nas férias lectivas tem de mudar de cantão."

Como é que conseguimos sobreviver os dois com 200 Francos por mês, sem morrer de fome, e o Wolf ainda ser capaz de escrever belos poemas, ainda hoje não consigo perceber. Porque aos emigrantes estava proibida qualquer espécie de trabalho (sob ameaça de repatriamento para a Alemanha nazi); havia um pintor alemão notável a quem até foi proibido pintar sòzinho em casa.

Às vezes o meu Director arranjava-me trabalho na substituição de colegas quando adoeciam; era a minha única fonte de receita. A clínica nem um prato de sopa estava autorizada a dar-me. Por isso pedi que me fosse atribuído serviço nocturno em dias de feriado. Como aí não estava autorizada a ausentar-me da clínica, não tiveram outro remédio senão alimentarem-me e darem-me uma cama decente.

O hospital oftalmológico universitário era financiado através do mecenato de membros abastadas do patriciado de Basileia, e o meu chefe, Professor Brückner, fez de um deles meu protector. O Senhor Hans Christ-Merian e a Esposa convidavam-me todos os Domingos à sua opulenta casa: aí havia um almoço dominical tal como antigamente em casa dos meus pais, e podia comer com fartura.

O Wolf e eu almoçávamos na Cooperativa; à noite só dava para uma carcassa e um pedacinho de chocolate. Na ausência de candidates suiços a um concurso, foi-me atribuído um lugar de Assistente da Secção Oftalmológica do Hospital Cantonal de Aargau (a partir de Janeiro de 1936), onde aprendi imenso, por o meu chefe, um homem frio, embora inteligente só comparecer no serviço durante uma hora em cada 24. Assim eu acabava, na prática, por ser a única responsável de 60 pacientes.

Até 1937 os nossos passaportes continuavam válidos, e obviamente não havia a minima esperança das autoridades alemãs nos darem novos passaportes. Estávamos a procurar desesperadamente um país que nos acolhesse. Em vão!

O Wolf que desde sempre se interessara por questões teológicas aproximou-se dum círculo em Basileia em que teólogos protestantes célebres (por exemplo o colega de Karl Barth, Eduard Thurneysen e muitos outros) debatiam problemas teológicos. Wolf confidenciou ao Pastor Thurneysen: "Nós gostávamos tanto de casar; tem algum conselho?" ´É que a Suiça tinha um acordo com a Alemanha que só lhe permitia casar pessoas que estivessem na posse dum certificado de capacidade matrimonial (Ehefähigkeitszeugnis) dado por uma autoridade alemã. Obviamente que, no nosso caso, não havia a esperança de alguma vez os obtermos. - O Pastor Thurneysen foi compreensivo, e descobriu que, em França, bastavam as certidões de nascimento para um casamento civil, desde que um dos conubentes estivesse a residir pelo menos desde há 6 semanas em França. Só mediante uma certidão de casamento civil é que lhe seria permitido casar-nos pela Igreja. Entretanto continuávamos desesperadamente à procura onde nos pudéssemos introduzir antes dos nossos passaportes caducarem - - après cela, le deluge!!!

Nesse momento veio a notícia salvítica do Otto de Londres. A prima Manna, estava com uma visita dum médico de Leipzig que, na posse dum diploma português de Medicina, se tinha estabelecido na Madeira como médico e andava à procura dum oftalmologista, por haver lá muita falta dessa especialidade. A Mãe resolveu, em Setembro de 1936, viajar comigo à Madeira para verificar in loco que não havia intrujice. Um advogado da Madeira confirmou que poderia praticar em colaboração com um medico português, sob condição de todas as receitas serem assinadas por ele e estar presente em todas as intervenções cirúrgicas. E havia efectivamente um tal médico, um velhinho amoroso.

Durante o meu tempo de Assistente em Aarau foi anunciado um concerto de Albert Schweitzer na Igreja, e eu estive a pensar longamente se me podia dar-me a conhecer. Finalmente venci a minha timidez e postei-me junto à saída, separadamente do magote de admiradores. Ele reparou imediatamente que havia ali alguém que não ousava aproximar-se dele e dirigiu-se a mim: "Com que é que a posso ajudar, minha filha?" Quando lhe disse que era filha do Professor Manasse, abvraçou-me e levou-me efusivamente com a turba de admiradores ao jantar na estalagem em que se encontrava hospedado e quis saber tudo acerca de mim e da minha família.. A partir daí desenvolveu-se uma frequente troca de cartas: ele respondia imediatamente a qualquer carta que recebia de mim. Quando soube que iríamos para a Madeira, pediu-me para ir expressamente ter com ele a Lausanne, durante um das suas estadas na Europa, para me dar instruções precisas sobre todos os cuidados que, eram necessários para viver num país subtropical. Emprestou-nos o dinheiro necessário para a viagem dizendo: "Um dia, quando forem ricos devolver-me-ão esta quantia - para o hospital de Lambarène." Entretanto tinha morrido um tio que me deixou 3000 Marcos que ficaram com a Mãe. Com o auxílio de prospectos encomendei ao mecânico instrumentista do Pai um equipamento impecável de oftalmologista que a Mãe pagou com parte dos 3000 Marcos da herança. O carregamento iria ficar sincronizado com a data de partida do nosso paquete, assim seria considerado bagagem de passageiro e ficar isento de direitos alfandegários.

No dia 21 de Dezembro teve lugar o nosso casamento civil de acordo com o "Code Napoléon" no registo civil de Hüningen (em patois alsaciano ao Wolf "Dü musch sie b'schütze 4" - e a mim "Dü musch'm g'horche 5"). A seguir fomos de carro eléctrico à Sé de Basileia, onde o Pastor Thurneysen celebrou com grande solenidade o nosso matrimónio. O acompanhamento no órgão e uma bela grande Bíblia foram gratuitas. Albert Schweitzer foi a única pessoa que nos mandou um telegrama de felicitações e nos ofereceu uma das suas famosas malas anti-termitas. Nos meus tempos de Aarau, as Segundas-feiras eram os meus únicos dias de folga. Assim tinha dito ao meu chefe: "Para a semana vou casar, obviamente no meu dia de folga; à noite estarei de volta ao serviço." A saudação no dia seguinte foi "Grüezi Fräulein. 6"

Durante o copo de água em Hüningen veio uma chamada telefónica de Saarbrücken: "Os franceses confiscaram os instrumentos médicos com o fundamento de que era armamento para a Guerra Civil de Espanha." Ficámos desesperados:. Como é que um medico oftalmologista moderno pode trabalhar sem instrumentos? Estávamos desesperados. A boa disposição festiva lá se tinha ido embora. Mas, vá lá, ainda tínhamos os bilhetes para a passagem de Cherbourg à Madeira.

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Portugal 1937 a 1945

Quando chegámos à Madeira a 4 de Janeiro de 1937, a nossa primeira deslocação foi naturalmente à polícia de estrangeiros. Em Basileia tinham-nos dito que, quando deixássemos de ter passaportes válidos, ou éramos presos, ou colocados na fronteira com a Alemanha, o que para nós teria significado a tortura e a morte. No Governo Civil do Funchal recebemos um sorriso radiante e incrédulo: "O quê, gostam tanto da Madeira que até querem ficar a viver por cá?" Julguei que tínhamos desembarcado no Paraíso. Passadas algumas semanas tínhamos obtido a nossa autorização de residência que só era preciso renovar uma vez por ano. Nunca mais nos pediram um passaporte.

Embora tenha arranjado uma ajudante, nos primeiros três meses tive de montar um consultório sem equipamento - a não ser com pequenos instrumentos que tinha trazido na bagagem de mão. Apesar disso os pacientes afluiam ao meu consultório improvisado. Três meses depois, lá chegaram finalmente à Madeira os grandes caixotes. Na alfândega exigiram-me o pagamento duma soma astronómica em Libras Esterlinas. Então apareceu a supracitada ajudante, uma suiça, que tratava por tu cá, tu lá a rapaziada toda da Alfândega, e que conseguiu através duma série de truques (graças a Deus nunca cheguei a saber quais) que eu recebesse os caixotes praticamente livres de encargos.

Os pacientes afluiam em torrentes. Os pobres faziam caminhadas de muitas horas a pé para receberem o unguento diário para a vista doente. Dava gosto ver como saravam rapidamente estes olhos doentes que nunca antes tinham sido tratados.

Não há primaveras eternas - e isso também foi o caso neste paraíso.
Havia na Madeira dois médicos que pretendiam ser oftalmologistas, mas que não tinham as mínimas luzes do assunto. Um deles aplicava diariamente um unguento num pequenito - mas sem algum sucesso. Não admira! Porque observei que uma pedra tinha perfurado a córnea. Depois a ferida sarou rapidamente. E assim iam aparecendo mais casos, o que manifestamente enfurecia os chamados oftalmologistas.

Um dia fui procurada por um velho que havia seis anos tinha perdido a vista em consequência de cataratas cinzentas em ambos os olhos. Ninguém quis assumir o risco duma operação, porque o homem sofria de asma e, ao ter os seus acessos de tosse, havia sempre o perigo da ferida rebentar. Assumi o risco e, quando o homem, depois da remoção do cristalino exclamou exultante: "Eu vejo!" tive um dos momentos mais felizes da minha vida. O homem ficou curado.

O episódio passou a ser tema das conversas em toda a ilha, e os dois "colegas" reagiram à humilhação. Depois de tanto sucesso com os meus pacientes algo tinha de acontecer. Fui chamada à polícia - provavelmente subornada. Foi me dito: "Pode escolher entre fechar o consultório ou ser mandada de volta à Alemanha." Fiquei desesperada. Mas o que é que eu podia fazer?

Wolf que, como humanista, só tinha estudado grego, latim e francês estava a aprender inglês com afinco, e eu ajudava-lhe na pronúncia. Além disso estudava todos os dias latim e grego durante uma hora, "para não estupidificar."

Procurei um médico português (o de Leipzig revelou-se como um egoísta explorador com quem não queria continuar a relacionar-me) e pedi-lhe para me recomendar a pacientes abastados que tivessem necessidade de "nightnursing." Foi um trabalho terrível: muitas vezes tinha de permanecer durante 12 horas seguidas e cheia de fome com novos-ricos mal educados, e quando, às 8 da manhã sentia o cheiro do pequeno almoço a subir, quase não aguentava mais até me poder precipitar sobre a desejada comida.

Entretanto os ingleses (a maior e mais influente comunidade de estrangeiros) descobriram o Wolf. Éramos frequentadores regulares da "Scots Kirk" dirigida por um sábio Pastor com um fraquinho pelo álcool e a nicotina. Tornámo-nos amigos, utilizávamos assiduamente a sua excelente biblioteca de romances e convidávamo-nos uns aos outros. No entanto, quando rebentou a Guerra em 1939, o Wolf achou que teria revelado falta de tacto, continuarmos a frequentar como alemães uma igreja britânica. O Pastor C. veio visitar-nos na nossa mini-casa para ver o que nos teria acontecido. Quando Wolf explicou a razão da nossa ausência, disse: "That's not your war, that's our war; your war started in 33." So that was settled.

Em Junho de 1941 foi-nos retirada a nacionalidade alemã, segundo comunicação do Cônsul da Alemanha.
Nessa altura chegaram à Madeira 5000 "evacuees" de Gibraltar. Foi então fundada uma escola inglesa, porque as crianças inglesas já não podiam ir frequentar colégios na Inglaterra, por causa da Guerra. Nas famílias bem passou a ser moda enviar-nos os seus jovens. Wolf dava-lhes alemão, grego, história da arte e história. Eu dava francês e português aos ingleses e ingles aos portugueses. Um Marco por hora era quanto cobrávamos.. Juntos dávamos 75 horas por semana. Muitas vezes trabalhávamos até às duas da madrugada, porque, à míngua de livros, tínhamos de passar tudo à máquina. Andávamos à caça de livros usados em toda a Ilha: Wolf encontrou um velho Vergílio num ferro-velho e eu um compêndio de francês numa loja de artigos domésticos.

Uma vez fui ao depósito dum trapeiro, em que descobri um achado sensacional: Um dicionário francês-inglês de 1825 - que eu de certo não poderia pagar! Perguntei quanto custava. A resposta foi: "Espere que eu vou ver." O homem pôs o livro na balança e disse "Vinte e cinco tostões" (correspondia na altura a cerca de 40 Pfennige). Fiquei contentíssima!

As ferias é que eram um problema. Nenhum jovem queria continuar a ter aulas; o que restava eram alguns adultos, entre eles o cultíssimo Vice-Cônsul do Brasil que leu com Wolf a segunda parte do Fausto e estudou grego.

Depois veio o fim da Guerra em 1945. Os "Gibs" voltaram a Gibraltar e os jovens ingleses eram enviados para os seus colégios em Inglaterra, e nós morríamos de saudades da Europa; porque a Madeira não era Europa, era um espécie de reino intermédio.

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Portugal 1945 a 1954

O Wolf recebeu da Europa vários convites para professor de Germanística em universidades alemãs, mas dizia: "Elas sabem lá o que eu sei; não quero ser convidado só por ser anti-nazi." Íamo-nos aguentando mais mal do que bem, mas o Wolf, depois da queda de Hitler, voltou a ser capaz de compor poesia; assim surgiu a "Paisagem Atlântica."

A minha mãe escreveu-me em 1950 de Londres, que a visitasse em casa do Otto, que ela me pagaria a passagem; a seguir iríamos ter com a Marianne a Saarbrücken. Aí ainda se estava sob ocupação francesa. Em 1951 fui acolhida carinhosamente em Londres por Änne e Otto. À cautela fui imediatamente ao Consulado Francês, para arranjar um visto de trânsito de Calais a Saarbrücken. Como ficámos apátridas, eu não tinha passaporte, mas apenas um documento de viagem português. O funcionário francês recusou-se a dar-me o visto e, quande lhe perguntei porquê, respondeu que era porque ele não queria. Marie-Thé, a irmã da amiga de escola da Mãe, ofereceu-se imediatamente para me ajudar. Falou com o dirigente máximo da autoridade francesa e lá me foi dado o visto.

Em Saarbrücken - gato escaldado - fui imediatamente ao Consulado francês, porque em 1951 tinha de se requerer uma autorização para viajar para a Alemanha a partir de Saarbrücken. Dei à secretária francesa o meu documento,de viagem português para requerer a autorização de ingresso na Alemanha. A resposta do Cônsul, que nunca cheguei a encontrar cara-a-cara (a inteligentíssima secretária é que funcionava como "go-between"): "Não dou esta autorização." - Eu: "E porque não?" - "O Senhor Cônsul diz que não cabe no papel." - Eu. "Então porque não lhe cola uma página?" A secretária: "O Senhor Cônsul diz que não está autorizado a fazê-lo." - Eu: "Então o Hitler afinal ganhou a guerra, e não os senhores. Porque enquanto o Hitler estava vivo, não podia ir ao meu país, e agora que morreu, também não posso." A secretária voltou radiante com a autorização.

Em Würzburg fui logo à Câmara Municipal para agarrar um passaporte. A funcionária foi muito simpática e disse: "Como filha do Professor Manasse vou-lhe dar já um passaporte, apesar de que devia pedir primeiro autorização a Munique." Assim em três dias voltei a ser alemã.

"O Deus dos viajantes não gosta de ti" disse a Marianne depois de todas as minhas peripécias, e oque se seguiu deu-lhe razão.

Enviei o meu documento de viagem português com o carimbo de saída da Madeira ao Cônsul Geral de Portugal em Hamburgo para o meu regresso e recebi a resposta surpreendente que não podia ingressar em Portugal com aquele documento; uma fundamentação não me foi dada.

"Vamos a Hamburgo" foi a única solução, porque estas coisa disparatadas não se conseguem resolver por escrito.

Através do amigo de Wolf, o pintor expressionista judeu Ludwig Meidner, que tinha visitado no seu exílio de Londres e que, tal como a sua mulher Else Meyer-Meidner me tinha oferecido belos trabalhos, sabia que que um velho amigo dele era Procurador Geral em Hamburgo. Como não conhecia mais ninguem em Hamburgo falei-lhe pelo telefone a partir da gare De Hamburgo às 8 horas da noite. Foi muito gentil e quando lhe perguntei se sabia duma pensão barata nas imediações, ofereceu-me imediatam,ente o sofa da sua cas. O Procurador geral Buchholz, a sua mulher e os três filhos trataram-me como se fosse uma parente próxima e uma visitante habitual. O Senhor Buchholz até foi comigo falar ao Cônsul Geral, uma figura essencialmente benévola que tinha sido impedido por uma secretária alemã maldosa de despachar a autorização de reingresso. Senti-me muito envergonhada perante a família Buchholz de ser levada a abusar da sua hospitalidade, permanecendo com eles durante mais três semanas, uma vez que a resposta de Lisboa foi muito demorada.

Assim o Wolf ficou isolado na Madeira de Julho a Setembro e teve de se sustentar sozinho, o que na Madeira nessa altura era bastante complicado - e isto quase sem dinheiro. Começou a ficar adoentado, e os médicos diziam que tinha angina de peito. Estava preocupadíssima. Depois de Buchholz ainda me ter acompanhado à editora Ellermann Verlag para publicarem a "Paisagem Atlântica" do Wolf, embarquei com dois grandes caixotes com livros do pai de Wolf numa casca de noz da linha "Neptun" para chegar depois de sete dias ao Porto. Tivemos que ficar durante muitos dias em vários portos por causa dos nevoeiros e enjoávamos todos, porque as ondas varriam o convés de lado a lado. Do Porto segui por comboio para Lisboa e daí num navio que conseguia baloiçar ainda mais (não se conseguia comer nada, o estômago só funcionava em sentido inverso) até à Madeira onde finalmente voltei passados cinco meses para encontrar o meu querido Wolf.

Agora era a vez do Wolf que estava gravemente doente e estava com um aspecto confrangedor. Através dum artigo do Dr. Adolf Arndt sobre o direito natural que levou o Wolf a escrever uma carta de 24 páginas a um amigo (que, sem o nosso conhecimento, a reencaminhou para o Dr. Arndt) desenvolveu-se uma animada troca de correspondência entre os Arndts e nós. Assim pudemos ousar perguntar-lhe se sabia de algum bom internista em Bona que pudesse examinar e tratar o Wolf. Juntámos os restos das nossas poupanças e o Wolf assim viajou em 1952 via Lisboa e Antuérpia para encontrar em Bona os Arndts (ele era o jurista do partido social-democrata) e o seu venerado professor e amigo Ernst Robert Curtius, que o receberam com muito carinho. O Wolf sentia-se como se estivesse no céu. Os Arndts puseram-no em contacto com um internista reputado que lhe disse: "Não tem nenhuma doença de coração, nem nunca vai ter." Todos os sintomas resultavam dos seus desgostos e das suas privações. Com uma medicação apropriada voltaria a estar saudável dentro de dois ou três anos.

Mas agora tínhamos tomado o gosto a outra vida e não teríamos aguentado a Madeira por muito mais tempo. Não havia lá ninguem com quem se podia ter aprendido qualquer coisa, não porque fôssemos demasiado sabichões, mas porque os outros não o eram mais. Algo tinha de acontecer! E algo aconteceu.

No verão de 1954 recebemos uma carta da recém estabelecida Legação da Alemanha em Lisboa: O Wolf tinha-lhes sido vivamente recomendado e pediam-lhe para ir lá apresentar-se.

Eu ainda tinha uns últimos restinhos de poupanças. Com esses o Wolf comprou uma passagem em terceira classe para Lisboa e foi nomeado Director dos cursos de alemão para adultos e em 1960 Director do Instituto Alemão em Lisboa.

Finalmente tínhamos conseguido.


Tradução de Bernardo Jerosch Herold e Clarisse Ferreira dos Santos

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Wolf Bergmann


Em: Gerhard Nebel, Portugiesische Tage (citado Segundo Heinrich Wilhelm Eggert, In Memoriam Wolf Bergmann. Bote aus Lissabon. Dezembro 1972)

Uma juventude brilhante, um estrasburguês que optou pela Alemanha, Albert Schweitzer e Ludwig Meidner, Stefan George e Theodor Däubler, Reinhold Schneider e Ernst Robert Curtius, tão forte na poesia como na prosa, e depois o pré-túmulo da Ilha Atlântica, solidão, ausência de diálogo, e a pior das torturas: não conseguir descolar-se da Pátria, embora em nome desta actuassem criminosos. Para quem passou a odiar os alemães era mais fácil, mas essa facilidade Montanus não a teve. A sua decisão de, apesar de espezinhado, continuar ligado à Nação a que pertenciam os seus espezinhadores não foi só a clarividência de quem sabe distinguir entre a substância da Nação e os que a maculavam, mas também acto ético de quem se abstém do que é cómodo e fácil. Revisitamos a memória, mas depois levantamo-nos e saudamos o presente, que é sempre instante, sempre imediato a Deus e inclui a eternidade...

São horas estranhas, que passo aí com o meu amigo, horas de distensão, de aprendizagem e de conhecimento dialógico, mas sobretudo de luto. Cultivamos mutuamente o nosso pesar, não nos libertamos dele com palavras fáceis, mergulhamos antes na sua profundidade. Bem conhecemos ambos o único Salvador, mas não queremos trazê-lo demasiado cedo ao terreiro, queremos que primeiro o pesar complete o seu trabalho, para que ELE encontre o campo preparado, um campo de destroços.


Tradução de Bernardo Jerosch Herold e Clarisse Ferreira dos Santos




Sempre em fuga...


...
Sempre em fuga,
Contigo foi bom e certo.
Silêncio! Em volta do rochedo
Pairam agora as aves.
...
Aqui já só há céu
E em baixo o som das ondas.
Sempre mais leve, graças a ti
Fujo voando.

Tradução de Bernardo Jerosch Herold e Clarisse Ferreira dos Santos




Bêco


I.
Tu, rapaz forte, cântaro, duras
Tempo bastante, não me preocupas.
Mas sobre vós, irmãos no firmamento,
Tenho dúvidas, pareceis vulneráveis.

Muitos, muitos dos queridos amigos foram
Assassinados.
Não é assim tão fácil recomeçar,
Mas é preciso, senão o inimigo regozija.

Onde há momentos ainda, crianças faziam barulho,
Fugiram, o vento acalma-se
E cai o silêncio nocturno à volta das casinhas.
Jaiminho dorme, com os seus seis anos, um faminto
Corajoso, e Adriano, um palito,
Magríssimo e munido de esperteza, dorme;
Mariazinha, a mentirosa honesta,
Isabelinha, a tagarela,
e o pai Silva e a Mãe Silva
Todos dormem o sono dos pobres.

Não é fácil recomeçar,
Mas é necessário, porque nos é permitido,
A terrestridade sincera do bêco o quer.


Wolf Bergmann
(em: Atlantische Landschaft, Hamburg 1951)

Tradução de Johannes e Marta Laitenberger




Excertos de cartas de Wolf Bergmann para o seu amigo Heinrich Hassmann



Sobre as suas poesias

A - da Madeira

Com o início da Guerra impus a mim próprio o silêncio poético e só o quebrei quando em Julho de 1944, aquele grupo de resistência tentou libertar a Alemanha dos seus opressores. Desde então tenho trabalhado num livro de versos que se deve chamar "Paisagem Atlântica"
para Hassmann, Novembro 1946

…Eu vejo agora mais nitidamente, e creio mesmo ter adquirido como que uma consciência sensível a cada tom errado, mas também aquela paciência que não se preocupa com os fins..
para Hassmann, Fevereiro 1947

Envio-te algums poemas que, se tu não procurares neles nada em segundo plano ou simbólico, traduzem duma forma mais precisa do que a transmissão normal, o milagre da vida aquí.
para Hassmann, Março 1947

Não procures de modo algum qualquer coisa de simbólico neles mas sim, poesia paisagística, se quiseres…
para Hassmann, Dezembro 1949


B - de Lisboa

O mais importante para mim, isto é, que o belo não vale nem nunca valerá nada sem aquilo que é justo, a Sra.Doutora Buddeberg como grande conhecedora de Rilke ja o tinha compreendido quando me disse: O senhor aquí pretende algo completmente diferente de Rilke. E assim é! Mesmo como simples anónimo também posso empenhar-me a favor do que é justo.


Sobre um problema prático na qualidade de director do Instituto Alemão

Podes informar-me como é que nós, a partir daquí do Instituto Alemão conseguimos que nos dêem um piano? Um piano pequeno, barato e leve, por que o nosso salão de festas que fica num apartamento não aguentava um piano pesado. Por causa de todos os novos equipamentos que tiveram que ser adquiridos, o nosso fundo de Bona esgotou-se. Mas, dar a conhecer a Alemanha sem um piano,,não é fácil .
para Hassmnn, Novemro 1956

O teu piano dá-nos uma grande ajuda,. exactamente aquela que eu esperava dele. Organizei logo serões em que cantamos canções tradicionais alemãs. Ao princípio tínhamos realmente todo o tipo de dúvidas por causa das dificuldades linguísticas, da falta de prazer em cantar da parte dos alunos, etc. Mas o sucesso deu-me razão, depois de eu ter treinado convenientemente o professor de ginástica da escola alemã, que é ao mesmo tempo professor de alemão do instituto, e que toca piano razoavelmente, e que ao princípio também estava muito hesitante, e depois de na primeira vez termos cantado a plenos pulmões as belas antigas melodies tradicionais. Da segunda vez já houve mais que cem participantes. Os alunos quizeram mesmo repetir imediatamente o ultimo serão. Por isso organizamos o terceiro logo a seguir ás ferias do Natal.
para Hassmann, Dezembro 1957


1 O pai de Charlotte foi Professor de Medicina Oftalmológica na Universidade de Estrasburgo e, depois do fim da Grande Guerra na Universidade de Würzburg
2 Georg Heym (1887 - 1912), poeta expressionista alemão
3 Em Estrasburgo
4 Tens de protegê-la
5 Tens de obedecer-lhe
6 Tratamento que, naquela época, era destinado às mulheres solteiras




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Aus dem Programm der Gedenkfeier:


Programm

Begrüßung

Crónica

sempre em fuga...

Bêco

Excertos de cartas de Wolf Bergmann